A legalidade da regulamentação municipal sobre a Nova Lei de Licitações e Contratações Públicas

A entrada em vigor da Lei Federal nº 14.133/2021, a Nova Lei de Licitações e Contratos, estabeleceu um novo marco regulatório para todas as esferas da federação: União, Estados, Distrito Federal e Municípios. No entanto, a aplicação plena desta lei federal pelos Municípios não é automática e levanta um questionamento crucial sobre a legalidade de sua regulamentação em âmbito local.

A Competência Normativa do Município

A Constituição Federal (CF/88) atribui à União a competência privativa para legislar sobre normas gerais de licitações e contratos, conforme o artigo 22, XXVII. A Lei nº 14.133/2021 cumpre esse papel ao fixar os princípios, as modalidades, as fases e os critérios basilares que devem ser observados por todos os entes.

Contudo, a mesma CF/88 garante a autonomia dos Municípios e lhes confere competência suplementar para legislar sobre questões de interesse local, desde que não contrariem as normas gerais federais (art. 30, I e II).

A Necessidade da Regulamentação Municipal

A Nova Lei de Licitações, em diversos pontos, possui um caráter de norma geral de eficácia limitada e faz expressa menção à necessidade de regulamentação pelos entes federativos para a sua aplicação detalhada. O Município, portanto, detém a prerrogativa e o dever de editar seus próprios atos normativos (decretos e instruções) para:

  1. Detalhar Procedimentos: Adaptar os ritos e as etapas da Lei Federal à realidade e à estrutura administrativa local. Isso inclui a definição dos agentes de contratação, das comissões, dos fluxos internos e dos sistemas eletrônicos a serem utilizados (seja o PNCP ou outro sistema próprio).
  2. Delimitar Regras Específicas: Regulamentar temas que a lei federal deixou em aberto ou delegou ao ente federado, como as regras para a pesquisa de preços, o funcionamento do Sistema de Registro de Preços (SRP) ou a definição do que se enquadra como “bens de consumo de luxo” no contexto municipal.
  3. Garantir a Eficácia Plena: Sem a regulamentação local, muitos dispositivos da Lei nº 14.133/2021 se tornam inoperantes ou de difícil aplicação prática, o que compromete a eficiência e a legalidade das contratações.

O Limite da Legalidade

A legalidade da regulamentação municipal, portanto, reside no seu caráter suplementar e complementar. O Município é legalmente apto a detalhar a lei federal, mas não pode, sob hipótese alguma:

  • Contrariar a Norma Federal: Criar regras que anulem ou contrariem os princípios e comandos estabelecidos pela Lei nº 14.133/2021.
  • Alterar Normas Gerais: Modificar os prazos, as modalidades ou os critérios de julgamento que são de competência exclusiva da União.

Em suma, a regulamentação municipal é não apenas legal, mas imprescindível para a efetiva transição e aplicação da Nova Lei de Licitações. Ela atua como a ponte entre a norma geral federal e a especificidade da gestão pública no âmbito local, garantindo que o interesse público seja atendido com legalidade, transparência e eficiência.

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